quarta-feira, janeiro 21, 2004

Para Quê?

Para quê tentar sentido,
Quando ele próprio anda perdido
Nas teias que ele próprio traça
Na procura de si mesmo?

Para quê fomentar o desejo,
Quando ele próprio nada quer,
Senão levar a pensar que o que vejo
É que causa a felicidade do ser?

Deixar-me estar aqui achado,
Permanecentemente no meio de tudo
E ao escrever, recusar ser mudo
Ao indecifrável movimento do mundo.

quinta-feira, janeiro 15, 2004

Verdade, Verdadinha! Ou eu não me chame...

X – Então, vamos lá descobrir a verdade?!
Y – Embora!
X – Mas só a absoluta!
Y – Claro! Senão não é a verdade!
X – Fotografaste-o?
Y – Sim, foi simples!
X – Olha lá para isto comigo, então.
Y – Está bem.
X – Então, mas isto não é a verdade!
Y – Não?!
X – Pois claro que não! Aqui não está o que veio antes, nem o que vem depois. E, para mais, só mostra uma das faces daquilo; e de uma só perspectiva, diga-se. Já para não ir mais longe e dizer que no processo da foto, ela primeiro estava ao contrário e só depois é que foi para o direito!
Y – Mas olha, o Z também gravou isto em VHS, queres ver?
X – Yeah, isso de certeza que resolve a questão!
Y – Vês, aqui está! O antes e o depois! Bem focado e tudo! E filmou-o todo à volta.
X – O quê?! Achas? Aqui só vejo um bocadinho do antes e do depois! E quando ele anda à volta deixa-se de ver o que está do outro lado!
Y – Ishhhh, pois é! Olha, vamos falar com o N. Dizem que os artistas são os melhores na procura da plenitude. E ele é um artista, oh diz lá a verdade?!
X – Eh… Oh, referes-te ao quadro do N. Eu também gosto do N mas temos que dizer a verdade, o objecto aqui é a cara dele!
Y – Eu não acho!
X – Pois também ele não devia ter achado, porque isso de achar é que o fez fazer isto! Alcançar a verdade equivale a olhar para ela sem filtros no meio, percebes? E já viste as cores? O que é que é aquilo?
Y – Devia ser de noite!
X – Oh, mas de noite ou de dia aquilo não é o mesmo?
Y – Pois… Devia ser… Mas olha lá, o que é que é aquilo para ti afinal?
X – Então… É aquilo não estás a ver?
Y – Estou mas...
X – Ah, já estou a ver. Olha aquilo é a,q,u,i,l,o. Está melhor?
Y – Ah, sim já estou a perceber! Então, mas se eu só ainda tivesse 6 meses e não conseguisse falar, aquilo não era o mesmo?
X – Era, era. Tu é que não!
Y – Hum. Eu nem devia dizer isto, mas… Sabes, no outro dia levei-o para casa e andei às voltas com ele. Abstraí-me de mim mesmo e mexi-lhe. Mexi-lhe mesmo! Olhei-o, cheirei o seu perfume, senti-lhe o gosto. Ouvi-o, percebes! Acho que consegui sê-lo!
X – É isso! Isso é que é a verdade! Já sabias afinal! Então diz lá como é que foi?
Y - Eh pá, não me lembro bem. E o que sei não consigo explicar…
X – Oh… Deixa para lá. Mesmo que te lembrasses, já foi no outro dia. E sabes bem que a memória não é. Parece! É como a fotografia de um quadro que caiu na lama e que, embora às vezes se suje mais que noutras, todos os dias está um bocadinho mais estragada. É a outra luz de nós. Pena só brilhar com força às vezes!
Y – Que chatice! Isto afinal não é assim tão fácil.
X – E temos sorte que aquilo está quieto, senão já estás a ver!
Y – Pois estou, estou! E já viste se aquilo pensasse?
X- Ah, ah, ah. O mais certo era estar agora a olhar aqui para nós, para saber, na verdade, o que estamos para aqui a fazer.
Y – Olha, verdadeiramente, mesmo que quisesse também não te sabia dizer.
X – Deixa lá isso. Vamos a mais um copo?
Y – Mais ainda? Heia!
X – Vá, desta vez pago eu.
Y – Vá. Vamos lá ter com N e com o Z, então.

sexta-feira, janeiro 09, 2004

Felizmente Ó Luar

Descalço os sapatos, que de tão molhados e enroscados parecem sofrer de cirrose, e reencontro o conforto. A lareira, que quando cheguei já rejubilava, solta flamas saltitantes que, fixadas, me observam e rodeiam, para meu aconchego. Em Israel chove igualmente. Bombas que nenhuma lareira consegue secar. Pelo menos é o que diz o homem da caixinha ao fundo. Ele é que sabe! Perguntem a quem quiserem. Entretanto a porta bate. Os músculos, doridos e adormecidos, fazem grande esforço na direcção da gravidade e impedem de me levantar. Entras, e sem um beijo, nem um lamento, descalças-me as meias e descolas-me as calças e a camisa. Então sim, beijas-me. Imaginava-me, igualmente, a desconstruir as tuas vestes molhadas. Mesmo que o quisesse, os músculos tinham-me presos a um cadeirão, que só agora reparei estar aqui, e a lareira havia conspirado contra mim, enganando-me através de movimentos animados, fazendo com que os olhos, os incessantes conhecedores de tudo, entrassem agora, lentamente, no desconhecido. E, sem querer saber bem porquê, sentia-me bem.

Passeio de domingo... Há sexta

Hoje vim aqui só para ver se isto ainda existe. Há tanto tempo que não mexem neste blog que até pensava que ele já tinha ido ao ar... Lá com pó está ele. Mas ainda existe!
Vá lá...

A Felicidade do Momento Regresso

Faltava aquilo que faltava a toda a gente.
Faltava o amor que a gente sente.
Faltava esse grito.

Tudo voltou quando regressaste.
Mas agora, o amanhã, o depois de amanhã
E o dia que depois desse há-de vir,
Acabarão por reduzir tudo isto a pouco
Muito pouco.

Deixa-me assim aproveitar
Este momento de consciência,
Não vá ele desaparecer...
Só por eu fechar os olhos.